sábado, 29 de agosto de 2009

INDEPENDÊNCIA OU MORTE?

UMA LEITURA DA OBRA DE PEDRO AMÉRICO

Existem controvérsias a respeito do famoso grito, de acordo com o padre Belchior Pinheiro de Oliveira, testemunha ocular dos acontecimentos, estes não teriam sido tão glamourosos como narram constantemente. De acordo com a versão do padre, o então príncipe regente retornava de Santos montado em uma mula e sofrendo de problemas gástricos quando recebeu a correspondência, tomando ciência de seu conteúdo, recompôs a farda, jogou e pisoteou os papeis dizendo ao padre, “nada mais quero do governo português e proclamo o Brasil para sempre separado de Portugal!” arrancando o chapéu e o laço azul e branco simbolizando a autoridade portuguesa dizendo em seguida, “Pelo meu sangue, por minha honra e por Deus, juro fazer a liberdade do Brasil”.





Outras peculiaridades norteiam este acontecimento. Não é rara a presença da obra O grito do Ipiranga nos livros didáticos, reprodução que limita-se a mera corroboração dos acontecimentos e do conteúdo estudado, é como se estivesse sendo dito “olha lá, foi desse jeito, eu disse! Raro sim é a analise contextual e ideológica da obra e os motivos de seu intenso uso.

Partindo do pressuposto que a arte reflete uma época, o método de contextualização é bastante pertinente tanto na pesquisa como no ensino de História, portanto relevante também para a compreensão da História e de uma época. Perguntas então se fazem necessárias: quem produziu tal documento? Que lugar seu promotor ocupa na estrutura social? A quem é dirigida a mensagem de seu documento? A partir de que argumentos organizam seu discurso? O que parece pretender com essa ou aquela afirmação?

Para isso, se faz necessária uma breve biografia do autor. Pedro Américo de Figueiredo e Melo (1843 - 1905) nasce na cidade de Areia na Paraíba. Aos 10 anos, participa como desenhista, da expedição do naturalista francês L.J. Brunet que percorre o Nordeste do país. Muda-se para o Rio de Janeiro em 1854 e, no ano seguinte, ingressa na Academia Imperial de Belas-Artes. Patrocinado por dom Pedro II, em 1859 viaja à França, onde aperfeiçoa seu estilo com pintores como Ingres, Cogniat e Vernet. Retorna ao Brasil e é nomeado professor da Academia Imperial de Belas-Artes, pinta cenas históricas, bíblicas ou mitológicas, influenciado pela arte academista do século XIX. Entre 1873 e 1885, o pintor vive na Europa e faz várias exposições. De volta ao país, é eleito deputado constituinte em 1890. Morre em Florença, na Itália.

A obra O Grito do Ipiranga, está atualmente exposta no Museu Paulista da Universidade de São Paulo (USP), instalado no conjunto do Monumento do Ipiranga. Trata-se de uma pintura histórica encomendada pelo governo de D. Pedro II, já no período de crise do império, afim de exaltar D. Pedro I e rememorar o “nascimento” da nação e do Império.

Pedro Américo que tinha uma estreita relação com o governo, foi encarregado de criar uma versão oficial do ocorrido e para isso fez uma obra enorme medindo 4,15 x 7,6m, inserindo elementos inventados, pintando cavalos imponentes e uniformes impecáveis do agrupamento da Guarda Nacional ( que só é criada em 1831 ). Outros elementos inseridos pelo autor podem ser observados na obra como, o boiadeiro e seu condutor, um viajante e seu escravo, além de uma casa ao fundo inexistente em 1822, construída apenas em 1850. O objetivo do autor era mostrar o processo de independência como um acontecimento que contou com a participação popular nem que seja de maneira passiva, bestializada com o que estava acontecendo ali.

O principal modelo artístico de Pedro Américo e o Romantismo (uma de suas características é o nacionalismo), e essa é a corrente artística do Positivismo, corrente científica que nasce com a sociedade industrial, defendendo a criação e a manutenção de uma ordem para o progresso da Nação. O positivismo que foi o principal modelo técnico-científico, usado inclusive pelas disciplinas escolares, que se apropriou desta obra para ratificar o heroísmo dos que promoveram a independência de uma nova nação e estimular o patriotismo no processo de educacional do “brasileiro”.

Portanto esses eram os interesses do autor, do governo e do sistema educacional, apropriação esta que foi feita desde o período do Império até o governo militar das décadas de 1960 e 1970. Atualmente é revista a sua função como documento, pois nunca foi inocente, apresentando interesses e ideologias de uma época e de um sistema a fim de elaborar uma mentalidade.

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